É na periferia das cidades brasileiras que podem surgir soluções para alguns dos maiores problemas do país. Guilherme Simões, entrevistado do último episódio do Betoneira, falou sobre os projetos e possibilidades que ele vem desenvolvendo na Secretaria Nacional das Periferias, uma novidade deste terceiro mandato do presidente Lula. A Secretaria Nacional das Periferias nasce das demandas e lutas históricas dos movimentos sociais das periferias e tem duas atribuições: urbanização de assentamentos precários e prevenção de riscos. Falar de política pública é falar sobre políticas para as pessoas, e uma enorme parte da população brasileira vive nas periferias, o convidado explicou.
“Nas periferias estão as pessoas que constroem as cidades.”
A população da periferia, por conta do déficit de atuação do Estado, acabou criando a economia da sobrevivência, o que gerou arranjos econômicos próprios. Na pandemia, por exemplo, grupos periféricos se organizaram para conseguirem se alimentar, garantindo a sobrevivência da comunidade.
Guilherme Simões falou sobre o Prêmio Periferia Viva, que visa reconhecer o papel dos agentes coletivos territoriais organizados nas periferias; são pessoas que desejam combater e buscar soluções para sobrevivência. “ Trata-se de um primeiro passo para que o governo federal se aproxime desses territórios.” Além disso, dentro do Programa Periferia Viva está ocorrendo o mapeamento da diversidade e multiplicidade de vidas e problemas que ocorrem nas várias periferias brasileiras. Guilherme Simões está viajando por diversos territórios nacionais para entender, de perto, o que pode se tornar política pública.
“Não dá para tapar o sol com peneira e romantizar a periferia, há muitos problemas.”
Segundo ele, é urgente reconhecer que as favelas e comunidades existem. Há gestores e prefeitos que acham que precisam acabar com as favelas. A política urbana precisa reconhecer que as favelas são realidades concretas e não irão desaparecer. Muitos políticos encaram as favelas como agrupamentos que não deveriam existir. Simões enfatizou que para formular políticas públicas é preciso coletar informação técnica e realizar o diagnóstico sobre como as pessoas vivem nas periferias. Urbanização das favelas passa pela infraestrutura, claro, mas levando em conta muitas variáveis; não é só passar concreto nas ruas, enfatizou Guilherme Simões.
“Qual o sentido de tirar uma parte das moradias para abrir uma rua? É só para a polícia transitar com mais facilidade? E os equipamentos sociais?”
A conversa também girou em torno do conceito de racismo territorial: são as pessoas negras as que mais perdem suas casas e sua dignidade com alagamentos, deslizamentos e com a falta de projeto urbanístico; esse cenário é consequencia do passado de escravização do Brasil.
O Brasil sempre contribuiu muito para políticas urbanas no sul global, e Guilherme Simões ressaltou que sentiu a alegria, por parte das autoridades, do Brasil ter voltado à mesa. O secretário realizou recentemente uma viagem para o Quênia e visitou duas grandes favelas de Náirobi; uma delas a maior favela da África, segundo os quenianos. Em Kibera e Mathare Simões conheceu a realidade dos quenianos: “Mathare tem edificações de pedra, pois os ingleses usavam a pedreira do local para construir a cidade. Quando a colonização acabou, eles abandonaram o território. Há uma forte presença da pedra, trata-se de uma paisagem cinza - com muita precariedade.”
O MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) e outros projetos da Secretaria Nacional das Periferias também foram tema da conversa.
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Quem é Guilherme Simões: Nasceu no Grajaú, em São Paulo, e gosta de chamar o bairro de “seu país”. Formado em Ciências Sociais na UNESP, de 2004 a 2008 foi professor tanto na rede pública quanto privada. Desde 2005 milita no MTST, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto e neste ano se tornou o Secretário Nacional das Periferias.
Baú do Betoneira
Danilo Santos de Miranda morreu no último dia 29 de outubro. Grande incentivador da cultura, ele revolucionou o SESC e defendeu a cultura, a arte e a educação nas diversas iniciativas e debates que promoveu ao longo das décadas. O Betoneira entrevistou este grande profissional em 2021. Para escutar, é só clicar aqui.